"Eu amo a rua[...] para compreender a psicologia da rua não basta gozar-lhes as delícias como o calor do sol e o lirismo do luar. É preciso ter espírito vagabundo, cheio de curiosidades e os nervos com o perpétuo desejo imcompreensível, é preciso ser aquele que chamamos de flâneur e práticar o mais interessante dos esportes , a arte de flanar." (Jornal Gazeta de Notícias, 1905)
FLANAR NA PERCEPÇÃO DE JOÃO DO RIO
"...Flanar é a distinção de perambular com inteligência. Nada como o inútil para ser artístico. Daí o desocupado flâneur ter sempre na mente dez mil coisas necessárias, imprescindíveis, que podem ficar eternamente adiadas. Do alto de uma janela como Paul Adam, admira o caleidoscópio da vida no epítome delirante que é a rua; à porta do café, como Poe no Homem da Multidões, dedica-se ao exercício de adivinhar as profissões, as preocupações e até os crimes dos transeuntes.
[...] O flâneur é ingênuo quase sempre. Para diante dos rolos, é o eterno "convidado do sereno" de todos os bailes, quer saber a história dos boleiros, admira-se simplesmente, e conhecendo cada rua, cada beco, cada viela, sabendo-lhe um pedaço da história, como se sabe a história dos amigos (quase sempre mal), acaba com a vaga idéia de que todo o espetáculo da cidade foi feito especialmente para seu gozo próprio.
[...] Quando o flâneur deduz, ei-lo a concluir uma lei magnífica por ser para seu uso exclusivo, ei-lo a psicologar, ei-lo a pintar os pensamentos, a fisionomia, a alma das ruas. E é então que haveis de pasmar da futilidade do mundo e da inconcebível futilidade dos pedestres da poesia de observação...Eu fui um pouco esse tipo complexo, e, talvez por isso, cada rua é para mim um ser vivo e imóvel." (João do Rio, A alma encantadora das ruas)
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