sábado, 26 de março de 2011

MICHEL FOUCAULT: HISTÓRIA DA LOUCURA


A nau dos loucos (Sultifera Navis, Narrenschiff), ou sobre confiar os loucos aos marinheiros:

A Sultifera Navis de Hieronimus Bosch. Quem são esses religiosos? Comporiam, também, a tripulação de loucos? Bosch se inspirou na sátiraDas Narrenschiff (1494), de Sebastian Brant, para formular este quadro. Sobre Bosch, ver também MILLER, Henry, "Big Sur and the oranges of Hieronimus Bosch".


"Esta navegação do louco é simultaneamente a divisão rigorosa e a Passagem absoluta. Num certo sentido, ela não faz mais que devolver, ao longo de uma geografia semi-real, semi-imaginária, a situaçào liminar do louco no horizonte das preocupações do homem medieval - situação simbólica e realizada ao mesmo tempo pelo privilégio que se dá ao louco de ser fechado às portas da cidade: sua exclusão deve encerrá-lo; se ele não pode nem deve ter outra prisão que o próprio limiar, seguram-no no lugar de passagem, Ele é colocado no interior do exterior, e inversamente. Postura altamente simbólica, e que permanecerá sem dúvida a sua até nossos dias, se admitirmos que aquilo que outrora foi fortaleza visível da ordem tornou-se agora castelo da nossa consciência. (...) É o Passageiro por excelência, isto é, o prisioneiro da passagem. E a terra a qual aportará não é conhecida, assim como não se sabe, quando desembarca, de que terra vem. Sua única verdade e sua única pátria são essa extensão estéril entre duas terras que não lhe podem pertencer. (...) Uma coisa pelo menos é certa: a água e a loucura estarão ligadas por muito tempo no sonho do homem europeu." (FOUCAULT, p. 12, Ed. Perspectiva 2004)

A navegação dos loucos, marcante em toda a Idade Média, só vêm à tona nas iconografias e na literatura bruscamente no século XV, pois a nau "simboliza toda uma inquietude, soerguida subitamente no horizonte da cultura européia, por volta do fim da Idade Média. A loucura e o louco tornam-se personagens maiores em sua ambiguidade: ameaça e irrisão, vertiginoso desatino do mundo e medíocre ridículo dos homens." (FOUCAULT, p. 14, Ed. Perspectiva 2004)

Somos covardes, mesquinhos e indolentes
velhos, cobiçosos e maldizentes,
Vejo apenas loucas e loucos
O fim se aproxima em verdade.
Tudo vai mal (EUSTACHE DESCHAMPS, citado por Foucault, p. 16)

"No pensamento da Idade Média, as legiões de animais, batizados definitivamente por Adão, ostentavam simbolicamente os valores da humanidade. Mas no começo da Renascença, as relações com a animalidade se invertem: a besta se liberta, escapa do mundo da fábula e da ilustração moral a fim de adquirir um fantástico que lhe é próprio. E, por uma surpreendente inversão, é o animal, agora, que vai espreitar o homem, apoderar-se dele e revelar-lhe sua própria verdade. (...) A animalidade escapou à domesticação pelos valores e pelos símbolos humanos; e se ela agora fascina o homem com sua desordem, seu furor, sua riqueza de monstruosas impossibilidades,é ela quem desvenda a raiva obscura, a loucura estéril que reside no coração dos homens." (FOUCAULT, p. 18)

A simbolização da loucura traz consigo os animais enquanto bestas perigosas e impuras: traz consigo a verdadeira desordem de um fim catastrófico do mundo, no entrecruzamento de sentidos, ou excesso de sentidos sobre as coisas. Este século XV, da passagem entre uma Idade Média e a Idade Moderna, vivencia deveras a Passagem: é o Satã quem vai ser recuperado, e quem vai espreitar os homens em sua locuura e animalidade, que os habita internamente. "Trata-se de um perigo mudo, de uma alteridade que provém "do outro mundo", mas que invade esse como que saindo das entranhas da própria terra. E o sábio, diante dessa alteridade, se inclina, fascinado por esse murmúrio que pode revelar a própria verdade do homem." (segundo um texto de Catatau)

A tragédia da loucura e o nascimento do sujeito

O século XVII, com Descartes, vê o advento da ratio (razão). Com e para a ratio, o século XVII criou diversas casas de internação, inventou o hospital para loucos e solidificou a idéia de que o louco deveria ser internado. “A não-razão do século XVI constituía uma espécie de ameaça aberta cujos perigos podiam sempre, pelo menos de direito, comprometer as relações da subjetividade e da verdade.” (FOUCAULT, p. 47). O inevitável cortejo da razão precisa da loucura como sua alteridade, como sua régua de medida. “Sob controle, a loucura mantém todas as aparências de seu império. Doravante, ela faz parte das medidas da razão e do trabalho da verdade.” (FOUCAULT, p. 43)

Para talhar este sujeito racional, será preciso todo um suporte moral, cosmológico e espacial: a subsistência, a boa conduta, a ordem geral. Mas a loucura continuará sempre à espreita, junto com outros sinônimos seus, os pobres, doentes, miseráveis; todos eles se opondo simbolicamente a esta ordem (e coerencia) esterilizada que se quer instituir. “(...) preocupação burguesa de pôr em ordem o mundo da miséria; o desejo de ajudar e a necessidade de reprimir; o dever de caridade e a vontade de punir; toda uma prática equívoca cujo sentido é necessário isolar, sentido simbolizado sem dúvida por esses leprosários, vazios desde a Renascença mas repentinamente reativados no século XVII e que foram rearmados com obscuros poderes.

O Classicismo inventou o internamento, um pouco como a Idade Média a segregação dos leprosos (...)” (p. 53). A miséria (e sinônimos vadiagem, insanidade, má conduta) se insere numa relação entre a ordem e a desordem, passando de uma experiência religiosa que santifica para uma concepção moral que a condena. Toda essa coerencia implantada sob a ótica da ordem acontece junto ao processo da Reforma Protestante, que traz consigo a cosmologia capitalista de que trabalhar é bom e faz você ir para o céu. Desse modo, cria-se uma sensibilidade que inventa um policiamento para impedir a mendicância e a ociosidade, bem como as fontes de todas as desordens. A miséria e a mendicância é assim despida de todo seu sentido místico e sagrado – este sagrado impuro – e a partir de então, este tema não será mais tão claro, posto que se enviezaram mística e moral.

Fonte: Blog Caderno de Leitura.

sexta-feira, 25 de março de 2011

DICA DE LIVRO: ANDARILHOS E CANGACEIROS


Ana Cláudia Marques, Felipe Faria Brognoli e Jorge Luiz Villela. Editora Univale
História e Geografia

Cada um dos ensaios que se seguem neste livro trata, com o auxílio de alguns operadores teóricos, de descrever a produção territorial de grupos cuja qualificação do espaço não se dá em torno de um lugar pontual de habitação. Os grupos estudados nesta obra não habitam a aldeia, nem a cidade, nem a vila. Não são, a rigor, nem rurais, nem urbanos. Os casos estudados aqui dizem respeito à difícil arte de produzir território em movimento.

DICA DE LIVRO: A GUERRA TOTAL DE CANUDOS


A Guerra Total de Canudos
Frederico Pernambucano de Mello, A Girafa Editora,368 páginas.
Frederico Pernambucano de Mello

Filipe Monteiro

Há 110 anos o Exército brasileiro atacava o arraial de Canudos, um lugar onde corria a lenda de que a “água do poço era leite e as pedras viravam-se em pão”.

O título do livro já diz tudo: a guerra foi total, sem quartel, sem inocentes. Embora a história de Antônio Conselheiro e seus fiéis seja bastante conhecida, o autor deste ensaio tenta romper com algumas interpretações clássicas sobre Canudos. Talvez porque a imagem que ficou foi aquela retratada por Euclides da Cunha em Os Sertões, onde jagunços e fanáticos seguiam os passos de um líder insano. Nada disso.

Belo Monte foi uma experiência inovadora, chegou a exportar couro para o estrangeiro, seus moradores cultivavam diversas espécies de frutas e legumes, possuíam gado, produziam rapadura. Tudo dividido por todos. Leite correndo pelos riachos parece lenda, mas lavouras ricas e moendas produtivas atraíam cada vez mais a população pobre do sertão, incomodando os donos da terra. Entende-se por que a guerra era inevitável.

Fonte: Revista da Biblioteca Nacional

quarta-feira, 23 de março de 2011

E LIZ DISSE ADEUS...


Musa de olhos cor azul-violeta, como ficou conhecida, a atriz Elizabeth Taylor morreu nesta quarta-feira (23), aos 79 anos, vítima de complicações cardíacas. Liz foi uma das grandes estrelas de seu tempo. Chegou à fama nos anos 1950, ainda com vinte e poucos anos (ela nasceu em 1932), e logou alcançou o posto de diva por conta de suas atuações marcantes no cinema -- ganhou dois Oscar de Melhor Atriz (pelos filmes "Quem Matou Virgínia Woolf", de 1960, e "Disque Butterfield 8", de 1966) -- e de sua beleza imbatível, feita de traços harmoniosos.Além da carreira como atriz, Liz também virou centro das atenções com seus inúmeros romances. Só de casamentos, ela contabilizou oito ao longo da vida -- dois deles com o ator Richard Burton, pai de um de seus quatro filhos e companheiro de cena em seis longa-metragens, entre eles, "Cleópatra", de 1963, quando iniciaram o romance.
Lá vou eu: Costumo dizer que as grandes estrelas do cinema como Audrey Hepburn e Ingrid Bergman, quando apareciam na tela, parecia que havia uma luz irradiada, não a partir do set de filmagem, mas delas próprias. Liz Taylor tinha essa luz. A foto da matéria sempre foi a minha preferida. Ela mostra uma mulher linda, mas paradoxalmente com um olhar melancólico. Liz viveu intensamente, como se estivesse sempre em busca de algo que nem mesmo ela sabia dizer o que era.

Fonte: Blog Camocim Online

terça-feira, 15 de março de 2011

50 ANOS DO CURSO DE HISTÓRIA DA UVA


O Curso de História da UVA viveu ontem(14 de março) uma noite de gala com a abertura das comemorações do seu Jubileu de Ouro, no Teatro São João. Para recepcionar os alunos e convidados, a organização trouxe o cantor e violonista local Edu Asaf que brindou o público com uma seleção da melhor música popular brasileira.
Abrindo a solenidade, o Coordenador do Curso de História Prof. Agenor Soares e Silva Júnior destacou o trabalho de todos aqueles que colaboraram para construção e longevidade deste curso numa universidade do interior cearense.
Em seguida, o Prof. Dênis Melo, apresentou o palestrante da noite, o Prof. Durval Muniz de Albuquerque Júnior, Presidente da Associação Nacional de História (ANPUH), que discorreu brilhantemente sobre o tema: “História: a arte de inventar o passado”. Em sua fala, o Prof. da Universidade Federal do Rio Grande do Norte ressaltou a importância do historiador em significar o passado, a partir das questões do presente, fazendo deste metier uma ferramenta de inserção social e política do historiador.
Segundo o Coordenador do Curso de História, professor Agenor Soares e Silva Júnior, as comemorações do ano jubilar continuarão com palestras, seminários, semana acadêmica do Curso e lançamentos de livros, que acontecerão a cada mês, ao longo do ano, e contribuirão para relembrar a trajetória do Curso e os seus avanços. “A data nos alegra e nos desperta a pensarmos sobre esse tempo e os que virão, sobre o que temos a melhorar na formação dos professores pesquisadores, e a trabalharmos em prol de uma produção historiográfica que evidencie ainda mais a importância do Curso no semiárido cearense”, disse o professor Agenor Soares.

O Curso de História da Universidade Estadual Vale do Acaraú obteve autorização para funcionamento por meio do Parecer nº 572/60, do Conselho Nacional de Educação, e pelo Decreto nº. 49.878, de 11 de janeiro de 1961. Seu reconhecimento como Curso de Licenciatura Plena se deu através do Parecer n° 324/71, do Conselho Federal de Educação, e pelo Decreto nº 68.855, de 02 de julho de 1971.

Fonte: Com informações do site: www.uvanet.br

quinta-feira, 10 de março de 2011

APROVADA A PROFISSÃO DE HISTORIADOR!!!


CCJ aprova regulamentação da profissão de historiador

A regulamentação da profissão de historiador foi aprovada, nesta quarta-feira (2), pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). A proposta, de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), estabelece que a profissão de historiador poderá ser exercida pelos diplomados em curso de graduação, mestrado ou doutorado em História.

Entre as atribuições dos historiadores, o projeto (PLS 368/09) lista o ensino da disciplina no ensino básico e superior; o planejamento, a organização, a implantação e a direção de serviços de pesquisa histórica; o assessoramento voltado à avaliação e seleção de documentos para fins de preservação.
A proposta já havia sido aprovada em decisão terminativa, em março de 2010, pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Mas a aprovação de emenda de Plenário do senador Alvaro Dias (PSDB-PR) e de requerimentos dos senadores Flexa Ribeiro (PSDB-PA) e do então senador Flávio Arns (PSDB-PR) fez a matéria retornar à CAS, bem como exigiu sua análise pela CCJ e pela Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE).

Relator do projeto na CCJ, Flexa Ribeiro recomendou sua aprovação com o acolhimento da emenda de Alvaro Dias. A mudança proposta em Plenário simplificou uma das atribuições dos historiadores para a "organização de informações para publicações, exposições e eventos sobre temas de História". O texto aprovado pela CAS detalhava os locais (empresas, museus, editoras, produtoras de vídeo e CD-ROM ou emissoras de televisão) de realização dessa atividade.

- O texto original do inciso que se pretende alterar era excessivamente detalhista e enumeratório, o que depõe contra a generalidade, clareza e precisão da norma - explicou Flexa Ribeiro em seu parecer.

O relator reconheceu o "relevante" papel exercido pelos historiadores na sociedade e considerou que a inexistência de uma regulamentação pode abrir esse campo a profissionais de outras áreas sem as qualificações necessárias para desenvolver um trabalho adequado com objetos e assuntos históricos.

Iara Farias Borges e Simone Franco / Agência Senado

Fonte: Artigo postado no site “Café História” por Bruno Leal no dia 06/03/2011